Estudo do TST sobre os direitos dos empregados domésticos

Estudo do TST sobre os direitos dos empregados domésticos

Conflitos trabalhistas envolvendo empregadas domésticas, diaristas e donas de casa estão formando a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho a respeito da relação de emprego doméstico. Uma das demandas na Justiça do Trabalho envolve pedidos de vínculo empregatício feitos por diaristas que prestam serviço a uma família mais de um dia por semana. Para o TST, o vínculo de emprego somente se forma se o trabalho doméstico prestado for de natureza contínua. Por este motivo, juridicamente, os direitos garantidos às empregadas domésticas não se estendem às diaristas. Em outras ações, domésticas reivindicam o direito à estabilidade provisória durante a gravidez. O TST julgou não haver o direito à estabilidade, mas determinou que seja paga às demitidas indenização equivalente ao salário-maternidade. No Tribunal, há controvérsias sobre o direito das domésticas às férias proporcionais e férias em dobro (caso não concedidas dentro do prazo). Acompanhe a seguir a jurisprudência do TST sobre domésticas e diaristas:

FGTS e Seguro-desemprego – Dos 34 direitos dos trabalhadores enumerados pela Constituição (artigo 7º), nove são extensivos aos empregados domésticos, entre os quais 13º salário, aviso prévio, aposentadoria e também a licença de 120 dias à gestante. A Constituição assegura ainda direitos como garantia de salário – nunca inferior ao mínimo -, irredutibilidade salarial, repouso semanal remunerado (preferencialmente aos domingos), férias anuais acrescidas de 1/3 e licença-paternidade. Uma lei recente (nº 10.208, de 2001) facultou ao empregador incluir a doméstica no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). Estando inscrita no FGTS e sendo demitida
sem justa causa, a doméstica terá direito ainda ao benefício do seguro-desemprego.

Após análise na breve legislação específica da categoria, é possível verificar que benefícios como Fundo de Garantia por Tempo de Serviço e seguro-desemprego só estão garantidos às empregadas domésticas que tenham carteira assinada. Apesar de não haver estatísticas oficiais a
respeito, a realidade brasileira aponta que muitas empregadas ainda trabalham sem carteira assinada, numa espécie de “informalidade doméstica”. Além disso, cresce no Brasil a modalidade de prestação de serviço executada por diaristas – que normalmente recebem remuneração
superior a que fariam jus se trabalhassem continuamente para o mesmo empregador -, mas não têm esses direitos assegurados.

Diarista X Empregada Doméstica – A Lei nº 5.859, que em 1972 regulamentou a profissão de empregado doméstico, dispõe que o empregado doméstico é aquele que presta serviço de natureza contínua. Para o TST, o pressuposto básico para configuração do trabalho doméstico é a continuidade da prestação de serviços, ou seja, o trabalho em todos os dias da semana, com descanso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos. É com base nesse pressuposto que os ministros do TST têm negado os pedidos de reconhecimento de vínculo empregatício entre diaristas e donas de casa. Muitas diaristas estão entrando na Justiça com ações onde pedem o reconhecimento de vínculo de emprego com o dono de uma das residências onde presta serviço em alguns dias da semana. O pedido é feito mesmo que a diarista preste serviço a várias famílias durante a semana.

No último caso julgado pelo TST, a pretensão de uma faxineira do interior de São Paulo foi frustrada. Ela pedia o reconhecimento de vínculo de emprego com os donos da casa na qual trabalhava um dia e meio por semana há vários anos. Na primeira audiência, a moça afirmou que era diarista e prestava serviços em outras casas. Mas, no seu entender, como trabalhava um dia e meio por semana para aquela família há vários anos, tal serviço não poderia ser rotulado de “eventual”. Seu pedido foi negado em primeira instância e em segunda, pelo TRT de Campinas (SP). Os juízes do TRT lembraram que, apesar de exercer as mesmas funções de uma doméstica, a diarista recebe valor superior em relação ao salário de uma empregada mensalista, não havendo sequer prejuízo previdenciário, porque a diarista pode recolher a contribuição por meio de carnê autônomo.

No TST, a questão foi julgada pela Primeira Turma, que manteve a decisão regional segundo a qual para a caracterização do emprego regido pela CLT é necessária a prestação de serviços de natureza contínua ao empregador. A Lei nº 5.589/72 também exige que o empregado doméstico preste serviços “de natureza contínua” na residência da família. “A não eventualidade ou a continuidade dos serviços é um pré-requisito para a caracterização do vínculo de emprego, seja este doméstico ou não”, afirmou o relator do recurso, o juiz convocado Luiz Philippe Vieira de Mello Filho. Segundo ele, o fato de as atividades da faxineira serem desenvolvidas em alguns dias
da semana, com relativa liberdade de horário, com pagamento ao final de cada dia de trabalho, além de haver vinculação a outras residências demonstra que se enquadra, na verdade, na definição de trabalhador autônomo.

É consenso no TST que não se pode menosprezar a diferença entre empregadas domésticas e diaristas. São situações distintas. Os serviços prestados pela empregada doméstica correspondem às necessidades permanentes da família e do bom funcionamento da casa. Já as atividades desenvolvidas pela diarista, em alguns dias da semana, assemelham-se ao trabalho prestado por profissionais autônomos, já que ela recebe a remuneração no mesmo dia em que presta o serviço. Caso não queira mais prestar serviços, a diarista não precisa avisar ou se submeter a qualquer formalidade, como o aviso-prévio. Isso porque é de sua conveniência, pela flexibilidade de que dispõe, não manter um vínculo estável e permanente com um único empregador, já que possui variadas fontes de renda, provenientes dos vários postos de serviços que mantém.

Apesar de o TST não estender às diaristas os direitos das domésticas, as donas de casa podem fazê-lo, por liberalidade. Em um julgamento, a Quarta Turma do TST reconheceu que é possível a celebração de contrato de trabalho doméstico para prestação de serviços de forma descontínua, se as duas partes assim o quiserem.

Doméstica gestante – Os ministros do TST já decidiram, por exemplo, que as empregadas domésticas não têm direito à estabilidade provisória no emprego durante a gravidez. Trabalhadoras gestantes são protegidas pela Constituição da dispensa arbitrária ou sem justa
causa desde a confirmação da gravidez até cinco meses depois do parto, mas o direito não se estende às domésticas. Embora a lei não resguarde a empregada doméstica gestante da despedida arbitrária ou sem justa causa, o empregador deve pagar, a título de indenização, o
equivalente ao salário-maternidade. O entendimento dos ministros do TST é o de que o término do contrato de trabalho impede o gozo da licença-maternidade a que a trabalhadora teria direito. O
salário-maternidade é devido à empregada doméstica e seu pagamento é feito diretamente pela Previdência Social. Por isso, se o empregador impede o acesso a esse direito por meio da dispensa sem justa, ele é o responsável pela indenização correspondente.

Férias proporcionais e em dobro – O direito às férias proporcionais quando a empregada doméstica é demitida sem justa causa ainda não tem consenso no TST: até agora as cinco Turmas e a Seção Especializada em Dissídios Individuais (SDI – 1) estão decidindo de forma divergente a questão, por isso o tema deverá ser unificado em breve. Num dos casos julgados, envolvendo uma empregada doméstica carioca dispensada no terceiro mês de gravidez, o TST reconheceu que nem a Lei 5.859/72, que regula a profissão de empregado doméstico, nem a Constituição de
1988 tratam expressamente do direito às férias proporcionais dos domésticos. O mesmo ocorre com o pagamento de férias em dobro quando o descanso não é concedido na época própria.

A lei assegurou às domésticas o direito a 20 dias úteis de férias após 12 meses de trabalho, sem nada mencionar acerca de férias proporcionais. O relator do recurso, o então juiz convocado Walmir Oliveira, aplicou ao caso a teoria da responsabilidade civil extracontratual, prevista no artigo 159 do Código Civil, para determinar que a dona de casa indenizasse a doméstica pelo dano
causado. Segundo ele, quando a lei é omissa, o juiz deve decidir o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito. “Existindo previsão legal e constitucional que assegura ao doméstico o direito ao gozo de férias quando completados os primeiros 12 meses de serviço, constitui inaceitável discriminação rejeitar a pretensão à indenização compensatória de férias proporcionais”, afirmou o relator à época.

Defensor do direito dos empregados domésticos às férias proporcionais, o ministro João Oreste Dalazen tem dito que, embora os direitos trabalhistas da categoria estejam taxativamente contemplados na Lei 5.859/72 e na Constituição Federal, deve ser aplicado à situação, por analogia, o artigo 147 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). O artigo garante ao empregado demitido sem justa causa, ou cujo contrato de trabalho se extinguir em prazo
predeterminado, antes de completar 12 meses de serviço, direito à remuneração relativa ao período incompleto de férias.

Já o ministro Vantuil Abdala entende que o princípio da isonomia não pode ser aplicado ao caso. Para respaldar seu entendimento, o ministro lembra que a Lei 5.859/72 estabelece que o doméstico somente adquire direito à férias (de 20 dias úteis) após 12 meses de trabalho e, mesmo após a Constituição ter garantido ao empregado doméstico o mesmo direito, o TST tem entendimento firmado no sentido de que as referidas férias continuam a ser de 20 dias úteis – diferentemente das dos trabalhadores em geral, que são de 30 dias corridos.

Há controvérsias ainda sobre se as empregadas domésticas estão ou não abrigadas pela CLT, tendo em vista que a categoria é regida por legislação específica. Para o ministro Milton Moura França, a partir do momento em que a Constituição assegurou à empregada doméstica uma
série de direitos trabalhistas, é razoável aplicar-se, paralelamente, dispositivos infraconstitucionais que tratam de pagamento, prazo e multa relativos às obrigações legais de seu empregador. “Se
admitirmos o contrário, o empregador poderá procrastinar o cumprimento da obrigação, por não estar sujeito a nenhuma cominação”, defende Moura França. O ministro determinou que uma dona de casa pagasse multa por pagar com atraso as verbas rescisórias devidas a uma ex-empregada. A multa consta do artigo 477 da CLT.

Sindicato – O TST já decidiu também que a homologação do termo de rescisão do contrato de trabalho de empregada doméstica não necessita ser feita obrigatoriamente perante o sindicato da categoria. O relator de um recurso envolvendo o tema, ministro Carlos Alberto Reis de Paula, afirmou que não há previsão na legislação específica (Lei nº 5859/72 ) ou no dispositivo constitucional (artigo 7º CF).

FONTE: TST